Das paixões platónicas
Saí da minha cabeça! - gritou desesperada depois de passar 12h ininterruptas a pensar nele. Saí da minha cabeça - repetiu agora com mais calma, um pouco culpada de ter sido rude com ele, ainda que em pensamento.
Soltou uma expiração pesada tentando expulsar pelo nariz todas as fantasias que lhe povoavam a mente. Pedro! Pretensioso sem dúvida, com a profundidade emocional de uma criança de 5 anos, filho único, possivelmente mimado e com quem não tinha rigorosamente nada em comum.
Mas havia outros factos a considerar: alto, com uns braços alvos e tentadoramente demarcados que desembocavam numas mãos grandes e ágeis, cuja a suavidade nunca a deixavam de surpreender. Os seus olhos de um modesto tom de castanho, deixavam transparecer uma profundidade e meiguice impercetíveis no seu carácter.
Não eram de todo compatíveis, mas ainda assim tudo nele a atraia insuportavelmente.
Nunca se cruzaram pela rua, ou se encontraram num desses acasos fortuitos a que as pessoas chamam de destino. Pelo contrário, viam-se pontualmente 1 vez por semana, no ginásio lá da terra onde ele trabalhava como instrutor na sala de musculação.
Não era "amigos" nas redes sociais, nem ela era, uma das muitas fanáticas do fitness com quem ele costumava conversar. Ainda assim era simpático e deixava-lhe umas piada no ar, a menos que o ginásio estivesse mais lotado que o habitual, nesse caso ela rapidamente tornava-se invisível.
Como tal S. Maria, tomada pelo desespero de já não ter idade para paixões platónicas, nem um estilo de vida compatível com a sua imaginação fértil e desenfreada, resolveu puxar o travão. Munida de umas gramas de amor-próprio e de muita força de vontade, transformara a frase "sai da minha cabeça" num mantra diário, que repetia religiosamente até a exaustão, embora sempre fraca em convicção.
S.